
Adelina Graça
Duas rodas, duas asas
OPINIÃO
Último dia da viagem à Andaluzia
A última etapa antes de rumar a Lisboa, nesta que foi a minha primeira grande viagem à Andaluzia, era rumar para Córdoba.
andardemoto.pt @ 10-11-2022 13:23:06 - Adelina Graça
Cedo arranquei de Baza, com o bichinho que nos começa a incomodar. Quando começas a sentir o fim da viagem, sentes que o tempo passou demasiado depressa, não queres terminar.
As últimas etapas das viagens fazem-se sempre com aquele sentimento de nostalgia e vontade de voltar para trás e, talvez por isso, a estrada nos pareça mais triste.
Mas ainda não tinha acabado, tinha curiosidade de visitar Córdoba.
Sob um calor imenso, dei por mim a atravessar a ponte sobre o rio Guadalquivir. Quase sem te aperceberes, entras na confusão. Um centro urbano denso como aquele (estamos a falar do segundo maior centro histórico da Europa), não vale a pena arrastares os dedos no GPS, só há uma coisa a fazer naqueles momentos: parar e reorganizar a tua direcção.
Uma das coisas que aprendi ao longo da viagem é que não vale a pena insistir no caos, nem entrar em stress quando percebes que perdeste a direcção, muito menos, insistir em arrastar os dedos no GPS à procura de uma saída, só agravas o problema. A distração no meio do caos pode ter consequências graves.
Por isso, parei na primeira oportunidade. Por sorte, tratava-se de uma gelataria que, como devem imaginar, sob um sol escaldante e uma temperatura acima dos 40 graus, soube-me que nem ginjas.
Lá me sentei com o dito GPS na mesa e aí sim, GPS numa mão e telemóvel na outra, foi um instante enquanto arranjei um hostel junto à mesquita de Córdoba, bem no centro histórico.
Depois, foi arrancar e seguir as instruções do sábio e impiedoso GPS. Num instante, estava no meio daquelas ruas empedradas, cuja largura ameaça a todo o instante as malas da “rodas altas” e com transeuntes que acham que perdeste o juízo para andar ali de moto.
Mas tudo compensa, as ruas de Córdoba no centro histórico são absolutamente deslumbrantes, é a maior área urbana do mundo declarada Património da Humanidade pela UNESCO. Cada rua é um museu, não há varandas sem flores, as cores das ruas, cada recanto é uma obra de arte, com pequenas esplanadas que se fundem com o verde das plantas, o ocre dos edifícios que contam histórias milenares e as cores garridas das flores, que se debruçam sobre as paredes.
As ruas são totalmente irregulares, estreitas e caóticas, mas com a ajuda divina do GPS lá cheguei ao hostel.
Tenho como princípio quando viajo, que a melhor forma de conhecer uma cidade é aproveitando o que a moto te pode dar, isso significa parar no centro histórico, claro que é sempre um desafio para o teu sistema nervoso central que oscila entre o “como é que te meteste aqui” e o “uau, valeu bem a pena”.
Depois de o recepcionista do hostel me ajudar a encontrar um buraco para meter a “rodas altas” e provavelmente pensar para ele “trouxe a moto para aqui, isto há com cada maluquinha!”, lá subi para o quarto, maravilhoso, abri as janelas e senti que estava no meio da rua, um ambiente cheio de vida e de movimento, de pessoas, de cheiros, de sons e sobretudo, de história.
Os pátios a cada esquina são quadros, as ruas contam histórias milenares, os sons da mesquita, os sinos das igrejas, a vivacidade das ruas, o cheiro das esplanadas, é impossível descrever o que se sente.
Esta foi a última grande cidade da Andaluzia antes de voltar à minha maravilhosa Lisboa, contas feitas e 3000 km depois. A Andaluzia ficou-me gravada no coração. É um mundo de gentes, de sabores, de cheiros e de história que te entram pelo capacete.
Aprendi muito, vivi emoções que guardo no coração. Hoje sei que nas viagens de moto o mais provável é acontecer o improvável! Mas, o mais surpreendente é que existe sempre uma força em ti que resolve, sabe-se lá como!
No dia seguinte, quando sair de casa para o trabalho e me cruzar com a “rodas altas” na garagem, só uma expressão virá à memória: “duas rodas, duas asas”.
andardemoto.pt @ 10-11-2022 13:23:06 - Adelina Graça
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