Adelina Graça
Duas rodas, duas asas
OPINIÃO
Verão
Verão é sinónimo de motos.
andardemoto.pt @ 14-9-2025 12:30:00 - Adelina Graça
É certo que alguns motards circulam todo o ano — eu incluída — mas o verão carrega consigo uma aura diferente. Mesmo quando o calor abrasador ou o incómodo das estradas, pejadas de condutores cuja ousadia suplanta a destreza, nos tolhem o caminho ou, entre manobras mais ou menos arrojadas, nos exaltam e, inevitavelmente, nos arrancam uns impropérios que logo se desfazem, diluídos pelo calor do sol e pela brisa salgada do mar.
Verão também é nostalgia.
Cada quilómetro junto à costa liberta memórias: dos tempos em que perseguíamos os bailaricos de verão nas pequenas — mas indomáveis — cinquentinhas, que ninguém sabia bem como conseguiam atingir os cem à hora, voando de festa em festa em busca do spot perfeito.
As cinquentinhas eram sinónimo de liberdade, de aventura. Alimentavam sonhos de viagens até ao fim do mundo — ainda que o “fim do mundo” fosse, apenas, partir do meu profundo Alentejo até à praia fluvial das Minas de São Domingos. Ali, depois de um dia inteiro de mergulhos e sol, entre copos de imperial e escaldões, discutíamos qual era a melhor máquina: a mais veloz, a mais bonita ou, simplesmente, a que pegava à primeira.
Os dias corriam entre praias, música de verão, festas de aldeia e as cinquentinhas que, a cada kickada, se lançavam Alentejo fora, debaixo do calor intenso, em direção a qualquer lugar onde houvesse música e amigos — com uma corrida improvisada pelo meio, invariavelmente a cem à hora.
Hoje, o verão mantém a sua magia.
A única coisa que se perdeu foi o kick que já não está lá. De resto, continuo a arrancar para o arraial, para a praia ou para o mais requintado sunset, sempre com o mesmo espírito, rumo ao encontro de amigos, do mar e da música.
A moto já não berra como outrora, não leva óleo misturado na gasolina, não deixa o casaco da Chevignon impregnado de fumo. Mas, como antes, corre a cem à hora pelo verão fora, à procura do melhor spot partilhado com os amigos.
Os temas também mudaram pouco. Afinal, depois de tantos anos, continuamos a sonhar e a discutir qual é a que anda mais, a mais bonita, a que pega à primeira… e, agora que as costas já não são as mesmas, também a mais confortável.
Um verão sem motos não tem melanina: falta-lhe o sangue a ferver, o coração em sobressalto, a vibração da estrada e as acesas discussões, por entre gargalhadas e provocações, sobre a melhor máquina.
andardemoto.pt @ 14-9-2025 12:30:00 - Adelina Graça
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