Pedro Alpiarça
Ensaiador
OPINIÃO
“Did you have fun?”
Para todos aqueles que estão habituados a rolar sozinhos, acostumados às suas condições, aos seus timings e a definir o seu ritmo, estas linhas não farão grande sentido.
andardemoto.pt @ 17-3-2024 17:30:00 - Pedro Alpiarça
Pois então, que os grandes espaços os brindem com as melhores estradas possíveis e que a partilha interna da sua experiência seja profícua em imagens de comunhão com a sua máquina de duas rodas.
Os restantes viciados neste universo único, estão sempre prontos para desafiar um amigo (ou um grupo restrito de amigos) para dar “uma voltinha de moto”. Seja por umas horas no seu quintal asfáltico, seja por uns dias ou até mesmo semanas a descobrirem novos horizontes, o princípio é sempre o mesmo. A companhia no desafio. Vencer uma existência cinzenta e monótona na presença de amigos que gostam tanto ou mais de motos que nós. Vão afinando preferências, e os andamentos semelhantes tendem a ser a cola que une as boas parelhas. Os que ainda não as conhecem, procuram-nas nos grupos que se dedicam a adorar um modelo ou marca específica, ou entregam-se à chamada “tribo do colete”, cumprindo o seu ritual de passagem num dos muitos motoclubes existentes.
Eu não sou diferente. Muito embora goste muito de passar horas sozinho a acumular quilómetros para expandir a minha eternidade, durante muitos anos rolei em grupo. Dessas afinidades motociclísticas guardo um núcleo duro de pessoas com as quais sou bastante feliz a partilhar apexes, dias de Sol a Sol, poeiras e parvoeiras. Mas mais recentemente tive de me adaptar a uma nova realidade. Rolar em trabalho. Com a maior das estimas que hoje nutro pelos meus colegas jornalistas, o encaixe não foi fácil. Tive de aprender a ser mais comedido na impulsividade, tive de aprender a ler os sinais de quem não passa a fronteira bem definida entre prazer e trabalho. A não ser que a apresentação tenha um guia inglês.
Esses gloriosos seres de olhar vago e emoções polidas, têm (na sua grande parte) escola de road-racing, e estão habituados a serem estupidamente rápidos em condições onde a margem de erro é muito curta. Não existe vergonha absolutamente nenhuma de confessar já ter “suado do bigode” em troços que tenho obrigação de conhecer melhor do que eles (na N2 a atravessar o Caldeirão, por exemplo). Nessas alturas, acabo sempre a fazer a figurinha triste de lhes perguntar como é que conseguem, qual é o segredo. E na maior parte das vezes, fico com a sensação de que olham para mim com a condescendência de quem - talvez um dia - me deixassem rolar com o seu grupo de amigos.
andardemoto.pt @ 17-3-2024 17:30:00 - Pedro Alpiarça
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