Pedro Alpiarça

Pedro Alpiarça

Ensaiador

OPINIÃO

Andem nos 60%

No princípio dos anos 2000, veio à luz uma música baseada num discurso de formatura que apelava ao uso de protector solar (Baz Luhrmann - Everybody’s Free to wear Sunscreen) como base metafórica para uma série de regras que serviam para aproveitarmos melhor a nossa vida.

andardemoto.pt @ 24-3-2024 17:30:00 - Pedro Alpiarça

Começava com um tom monocórdico e algo redutor na essência, mas rapidamente evoluía para uma catarse de sentimentos genuinamente preocupantes, onde acabávamos por questionar as decisões mais simples do nosso dia-a-dia e, derradeiramente, a maneira como o vivíamos.

Passados mais de 20 anos, volto atrás para vos dar um conselho semelhante, uma analogia esbatida em letras (sem a envolvência sonora que nos embala o espírito), mas com um conteúdo que se aplica à nossa existência motociclística. Não há plágio, mas aproveito o esquema…

“Senhoras e senhores, amantes das duas rodas, andem nos 60%.

Se eu vos puder dar algum tipo de conselho, será o de andarem de moto a 60% das vossas capacidades. Não existe uma base científica que prove a exactidão deste número, apenas certezas baseadas na minha experiência enquanto alguém que vive este mundo com toda a paixão possível.


Não releguem para segundo plano as condições da estrada, dos pneus, do contexto onde estão a circular. Haverá sempre a hipótese de um cruzamento onde a visibilidade é curta, onde alguém estará distraído com um telemóvel, onde a sinalização não foi respeitada. Deem hipótese à vossa capacidade de reacção, saber travar é tão importante como saber acelerar.

Não deixem de usar equipamento apropriado em TODAS as ocasiões, a desculpa da ausência de luvas sob a premissa de falta de tato é tão ridícula quanto a falta de protecção de coluna no vosso blusão. Acreditem que todo o material é pouco quando as leis da física nos traem. Vistam-se a pensar no acidente e não na imagem heroica que projectam em cima de uma moto.

Não sigam o tipo mais rápido na tentativa de provar que o conseguem acompanhar. Sejam humildes nas vossas expectativas. Há sempre mais um dia para rolarmos, e chegarmos a casa sãos e salvos é mais importante do que esbanjarmos testosterona na conversa de café.


Andem nos 60%. Porque a dádiva de podermos fazer o que mais amamos é tão importante quanto maior for o tempo em que o conseguimos fazer. Esta percentagem é diferente para cada um de nós, mas se tivermos a noção de que há dias em que teremos mais sorte que outros, a margem de segurança dos 60% deverá ser suficiente para sobrevivermos às adversidades.

Existirão alturas em que poderão tocar a eternidade numa comunhão intemporal com as vossas máquinas, mas para lá chegarem não podem ofender os deuses...eles têm inveja.”

andardemoto.pt @ 24-3-2024 17:30:00 - Pedro Alpiarça


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