Pedro Alpiarça

Pedro Alpiarça

Ensaiador

OPINIÃO

2 dedos de conversa

Já nos aconteceu a todos. Paramos a moto e vem alguém ao nosso encontro com vontade de conversar. Independentemente do modelo, da marca, da exclusividade ou popularidade da máquina em questão. É um verdadeiro fenómeno social, os veículos de duas rodas atraem diálogos de circunstância. Esta aconteceu não há muito tempo, num Portugal profundo:

andardemoto.pt @ 23-4-2023 12:31:00 - Pedro Alpiarça

Estava esgalgado de fome. Cego por um tasco nos últimos quilómetros de uma manhã em cheio, a mais pequena miragem de uma cerveja e uma bifana, faziam-me salivar. Era este o estado de espírito quando parei à entrada de uma vila perdida no Alentejo. Moto desligada, enquanto tirava o capacete e as luvas acercava-se de mim um local com ar curioso. Embora pouco mais velho que eu, as rugas de expressão denunciavam-lhe uma vida dura, com muito mais sol, daquele rude, sem esplanada ou praia. Não demorou muito a perder a vergonha.

- Bela máquina companheiro. É uma quê?

- Viva. É uma BMW. Bonita, não é?

- Tenho um primo com uma igual. Vai para todo o lado, é daqueles que vive em cima dela. A mulher nem o vê em casa… Olhe, é um sortudo!

- Pois… viajar nestas máquinas é uma maravilha.

- Qualquer dia compro uma também! Quanto é que isto custa?

- Bom... esta aqui está cheia de extras, mas começa nos (...)

- Eu já tive uma quando era novo, aquilo era só pôr gasolina e andar! Era mais pequena, mas cheguei a dar 150 na recta do Mosteiro, sabe qual é?

- A estrada? Assim de repente não estou a ver…

- Não! A moto! Era vermelha, pequenina, via-se muito por estas bandas, já não me lembro do nome…

Por esta altura percebo que esta conversa seria fantástica com uma mini fresquinha na mão. O meu estômago contorce-se de novo.

- Fazia uma fumarada desgraçada e quando lhe apertava o gasganete parecia um enxame de abelhas furiosas… mas das nossas! Não dessas que vêm lá da China e matam tudo…

- Pois…

- Qualquer dia peço ao meu primo para me deixar dar uma volta na dele. Isso tem muita força, não? Quanto é que isso dá? Para aí uns 200, não?

- Ó amigo, é como tudo, dá aquilo que lhe pedirmos. É preciso ter respeitinho.

- Certo, certo… Eu já não tenho idade para grandes loucuras. Na verdade, eu só queria ter uma boa desculpa para sair de casa e não ter de aturar a patroa. É que eu nem gosto muito de motos, sabe? 

andardemoto.pt @ 23-4-2023 12:31:00 - Pedro Alpiarça


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